Era mais um dia de trabalho na tenda umbandista,
iniciou-se os trabalhos com a linha de caboclos, onde comumente são os
que iniciam o trabalho na sessão desse templo. Por regra da casa, são os
caboclos que efetuam os passes fluídicos nos filhos da assistência que
ali adentram. Calmamente um a um vai adentrando no espaço de trabalho e
recebendo os fluídos benévolos da linha de caboclos.
Enquanto todos os
filhos incorporados e ocupados com os assistentes, uma senhora em seu
silêncio esconde uma dor inimaginável, ela sofre em silêncio aguardando
alguém que possa apaziguar sua aflição, mas ela não fala ninguém sabe,
para todos, é apenas uma pessoa em busca de um conselho ou um passe.
Começam as curimbas
para a subida dos caboclos, um a um esses bravos e maravilhosos irmãos
deixam seus aparelhos, e consequentemente o recinto físico da casa.
Começam-se os pontos
para os baianos, o louvor aos baianos é sempre entoado com grande festa e
expectativa, são os nossos queridos camaradas que nos ajudam
aconselhando e batendo um papo descontraído fazendo-nos esquecer nossas
aflições que ficaram de fora desse humilde trabalho.
Um a um os assistentes
vão conversando, tirando duas dúvidas e solicitando conselhos, e essa
senhora, não fugindo da regra, também o fez. Mas algo a incomodava, mas
ela talvez preferiu manter o silêncio.
Durante os trabalhos
dos baianos, a gira descontraída, fui tomado por um êxtase inexplicável,
eu não sou muito a favor de trabalhar com a linha da esquerda,
confesso, não por preconceito ou porque gosto de menosprezar essa
fantástica linha de guias, mas por opção e afinidade talvez.
Um baiano a chamou e
foi onde ela começou a mancar, começou a chorar de dor, dizendo que
estava com problemas nos rins, na perna esquerda e no braço direito,
sentia muitas dores na coluna também.
Sinto a vibração do Sr.
Marabô e me pergunto qual é o propósito de senti-lo em uma gira de
baianos, além disso, qual é o propósito de senti-lo se eu mesmo sentia
que os trabalhos corriam muito bem e sem maiores complicações?
A Vibração ficava mais
forte, até que eu não pude segurar, como sou um médium semiconsciente,
passivamente participei do trabalho dele e atento gostaria de saber do
porque de sua aparição. Eu, já sabia que ele é uma das entidades que
sirvo que atua enfaticamente na linha médica, mas qual o motivo para sua
presença ali? Mil coisas se passam na cabeça, até achei que algum filho
seria repreendido ou estaria ali alguma presença que por algum erro
deixaram passar… É incrível como o tempo é relativo, em questão de
segundos, veio um turbilhão de indagações em minha cabeça, até que…
- Tu, mocinha, venha cá! Disse ele.
Ela atônita e assustada faz com o dedinho indicador da mão direita em relação ao seu tórax, como quem diz: Eu?
- É, você mesma! Me acompanhe.
Vagarosamente a mulher o
acompanhou e a levou para outro setor dentro do centro, um setor mais
calmo para trabalhos mais tranqüilos. Com ele, foi chamado mais dois
médiuns, que eram de Iemanjá por sinal, para acompanhá-lo no trabalho.
Chegando ao recinto, ele mandou pegar quatro bancos e ordenou a cada uma das filhas:
- Eu quero a linha de
preto-velhos aqui, preciso fazer um trabalho conjunto com o início da
cirurgia que irei prestar, portanto, firmem a cabeça que eu quero suas
vovós aqui.
Enquanto os médiuns se
preparavam para efetuar a comunicação mediúnica, ele já sentou, pediu a
sua adaga, o marafo, seu charuto, e começou os trabalhos.
Lembro-me que uma
preta-velha ficou posicionada ao lado direito dessa filha, outra ficou
na parte posterior e o Sr. Marabô ao lado esquerdo, e iniciaram a
triangulação terapêutica sobre a filha.
Foi solicitado mel e um
chá de ervas, como temos essa disponibilidade no centro, fica muito
mais fácil quando se existe uma urgência. Assim que esse chá de ervas e
mel foi preparado, foi solicitado ao cambono ministrar três colheres na
boca da senhora.
- Funcionará como anestesia, minha moça
- Espero, senhor, a dor é indescritível
- Tenha paciência,
agirei em três frentes com você, você receberá passes fluídicos nas
áreas menos graves, como seu braço direito e sua coluna, mesmo assim,
teremos que fazer um tratamento de seis sessões, sua coluna deve-se a um
reumatismo que iremos remover com o tratamento, o cansaço de sua perna
deve-se a energias deletérias que serão excluídas de seu corpo, assim
como seu braço direito.
Com o punhal na mão ele continua:
- A situação mais
sensível é o seu rim, terei que fazer uma cirurgia psicossomática nele e
te receitar alguns chás, tenha paciência que em duas luas será
solucionado seu problema.
Após alguns minutos,
ela dizia sentir uma pontada muito forte na dor, em contrapartida,
estava tendo um alivio, uma espécie de formigamento em todo o corpo, e o
preparado com o mel anestesiou um pouco suas dores, nisso, já se ouvia
ela dizer: Graças a Deus, que Deus abençoe vocês.
Durante o trabalho, Sr.
Marabô não parou, muitas fumaçadas de charuto ao redor da paciente,
muita conversa, dizem que ele acalma muito os seus pacientes, contanto
piadas e brincando, atuando também no corpo mental do paciente.
Durante o trabalho ela perguntou:
- Que estranho exu fazendo cirurgia e cura, vocês não são da encruzilhada e servem pra proteger o terreiro? Disse ela.
- Sim, a linha de exu
em geral possui essa característica, mas tive um ofício na terra, que
por sinal era médico, por não me achar digno de ainda caminhar na luz,
caminho nas trevas, onde me sinto mais útil, e além de trabalhar sim,
com a defesa do centro, pois eu também sou um exu que é firmado na
tronqueira, eu também trabalho paralelamente com outros guias desse
menino para atuar com a cura.
- Interessante, disse, nunca conheci um exu que trabalhasse com cura.
- Talvez você já conheça, ele apenas não se plasma dessa forma a você, dando uma gargalhada ele retruca.
Com isso, ele passou pela última vez sua adaga e disse:
- Minhas velhas, agradeço, o primeiro estágio da cirurgia foi concluído.
Nisso as preta-velhas
que participaram ativamente da doação fluídica, de todo o magnetismo
energético, trocando más energias por boas energias, também devagar
foram desocupando seus aparelhos e fazendo com que as médiuns voltassem a
si.
Disse a paciente:
- Obrigado senhor,
vocês foram uma benção, eu andava com dificuldade pela dor, e agora
consigo andar sem incômodo no rim ou na minha costela, vocês são uma
benção, obrigado a você Exu.
- Agradeça a Deus, pois ele que deu a oportunidade para você aqui se curar e eu aqui atuar.
Com isso, a mulher foi
levando muitas outras pessoas com problemas de saúde e com a graça de
Deus, as graças também foram alcançadas por ela, e sinto-me muito feliz
de ter sido um instrumento para essa benção e muito honrado por servir a
esse Exú e a toda a Benevolência Cósmica.
Comentários:
Algumas lições tirei
com isso, alguns dizem que exus só podem trabalhar no escuro e não
incorporam com a presença da direita, percebe-se que isso é um mito, ele
só não veio durante um trabalho da direita, como também não foi
chamado, mas para atuar na Lei e praticar a Caridade tão pregada nos
templos, ele veio em nome da urgência que ali existia.
O exu não é apenas uma
entidade de encruzilhada ou de porteira, exu tem fundamento, exu tem
Luz, exu tem conhecimento, portanto, também existem exus que possam
atuar na cura, que também pode atuar com energias mais sutis.
E muitas escolas dizem
que exu é um exu de Xangô ou Oxossi, o meu é um exu que vem na vibração
de Iemanjá. E pelos meus ensinamentos, como os guias de Iemanjá trazem o
poder da cura, não é nenhum pouco surpreendente que o exu que “ela
escolheu” em minha linha, seja um digno mensageiro da vibração dela.
Saravá os Preto-Velhos
Saravá Sr. Marabô
Saravá os Exus
Saravá a Corrente Médica
Namastê
Neófito da Luz
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