O Papel das Máscaras na Cultura Africana
A
máscara é um objeto que causa um fenômeno intrigante, qualquer
individuo pode se tornar outra pessoa por debaixo de sua cobertura. Este
processo de transformação é apreciado por diferentes culturas para
simbolizar seus ancestrais e divindades na maioria dos rituais. Para
alguns grupos, como tribos africanas, o poder da máscara vem desde o período
de migração dos antigos povos. Algumas são criadas para assegurar
colheitas férteis, fator muito importante na maioria das sociedades
africanas, outras representam um papel sagrado na vida do indivíduo
africano vindo desde sua infância até o momento de seu enterro. A
máscara é vista como um símbolo e instrumento dentro de diversas
comunidades facilitando a identificação de qualquer família ou clã
dentro de seus ciclos.
A
maioria das máscaras é feita de madeira, devido a sua abundância
natural nas florestas. Os escultores selecionam freqüentemente os tipos
diferentes de madeiras com várias razões em mente. Para o africano, a
árvore é um ser vivo com alma, assim eles a cultuam com
vestimentas acreditando que elas tenham uma vida melhor até o momento de
seu corte ou morte natural. Elas também possuem espíritos que habitam
seu interior, este fato leva o escultor a consultar freqüentemente um
Bàbáláwo, que realiza cerimônias de purificação e oferece um sacrifício
para satisfazer o espírito da árvore com antecedência. Assim que a
árvore é cortada, o escultor chupa sua seiva para alcançar uma
fraternidade com o este mesmo espírito, fazendo com que ele possa achar
uma nova moradia em outro lugar. O escultor acredita que este espírito
transfere uma parte de sua força à máscara ou escultura, tornando-as
poderosas. O talento do escultor em fazer máscaras sagradas se assemelha
ao de um mestre que utiliza muita filosofia e sentimento em seus
ensinamentos e doutrina. A madeira fresca é verde e macia, fator que
facilita o trabalho do escultor, que por muitas vezes esfrega óleo de
palma na peça para reduzir a velocidade no processo de secagem.
Geralmente
a madeira apresenta várias manchas de sangue causadas pelos ritos de
sacrifício a fim de simbolizar seu valor e poder. O escultor retira
somente o excesso destas manchas amolecendo sua superfície com materiais
orgânicos como folhas, peles de animais e arenito. A pintura é feita
com a extração de tinturas vindas de folhas, frutos, alguns legumes e até mesmo da terra.
Existem
outros tipos de máscaras feitas com outros materiais como pano, ráfia,
conchas, contas, dentes, ossos, fibras vegetais e pedaços de metal. As
Máscaras retratam variedades faciais que podem ser abstratos, animais,
uma combinação de características humanas como expressões
amedrontadoras exageradas ou alegres e festivas, além de se diferenciar
através de suas várias formas e tamanhos diferentes. Algumas Máscaras
ficam presas diretamente na cabeça do dançarino, outras podem se
sustentar frente à face presa na fantasia ou coberta de cabeça, como
também existe um tipo parecido com um grande capacete que cobre a cabeça
inteira e fica descansada sobre os ombros. Existe também uma máscara de
panos bem grossos que tem uma aparência quadrada que fica presa na
coroa da cabeça, unida a uma fantasia que cobre o corpo inteiro até os
dedos dos pés. O dançarino olha por uma abertura no material da fantasia
ou por um fino pano negro que lhe cobre face. O efeito é fazer o
dançarino se aparecer com um antigo sacerdote, confirmando a convicção
que ele é um espírito sobrenatural. São de dois modos primários as
funções das máscaras africanas: o primeiro é utilizado em cerimônias
públicas com participação de audiência; e o segundo provê uma cerimônia
privada para sócios de uma sociedade secreta. Elas exercem funções nos
principais rituais comuns como funerais, cultos de antepassado,
iniciações e mitos que podem ser representados por máscaras de animais
mitológicos, heróis e até mesmo o sol e a lua.
A
fertilidade e aumento de humanos, animais ou a terra estão entre as
preocupações mais vitais do africano. Ele depende de harmonia com a
natureza e seus Deuses. Sendo assim, as festividades agrícolas são
periodicamente celebradas ao longo das fases diferentes da estação
crescente, de clarear a terra a encher as reservas de
comida. Os altos sacerdotes utilizam suas máscaras durante todas as
festividades representando uma comemoração teatral de suas divindades e
ancestral, mostrando o conceito básico que a terra pertence aos
antepassados. Uma colheita próspera depende da bênção deles e do
testemunho do Ser Supremo. Observem que não estou representando
diretamente os Òrìsà ou Olódùmaré simplesmente por estar falando de
várias tribos e cidades diferentes de toda África. Os ritos funerários e
o culto de espíritos ancestrais estão entre os rituais mais difundidos
no mundo. Estes cultos são relacionados a uma larga variedade de
ocorrências extremamente importantes, como a fertilidade da terra, seus
animais e seres humanos. Os africanos acreditam que aqueles que morrem e
são enterrados, fertilizam a terra com suas almas. Sendo assim, a terra
pertence a eles, os antepassados, que são invocados para comemorar
junto com seus familiares à harmonia do presente momento. Eles são
vestidos com belas roupas que seriam preparadas justamente para o
momento do retorno após a morte, como também utilizam as máscaras que
simbolizavam suas identidades dentre os outros membros da comunidade.
Para as sociedades secretas, os ritos de passagem acontecem quando um
homem se move de um ciclo a outro em suas fases da vida. Nenhuma
transição é mais importante que a passagem de adolescente para adulto,
lhe dando direito de se tornar um sócio responsável da sociedade. As
Máscaras que são usadas nas sociedades secretas servem para manter em
segredo várias cerimônias de iniciação.
Há vários tipos
de sociedades secretas, mas o propósito principal delas é manter as leis
e o exercício de controle social e político em cima das atividades
comunitárias. Podemos concluir que as máscaras são símbolos que ilustram
pessoas diferentes em diversas partes de sua cultura, estando presente
no nascimento, adolescência, maioridade, matrimônio e morte. Embora
estas passagens são semelhantes em toda natureza, nossas interpretações
destes rituais ou cerimônias mostram que sempre esteve bem centralizada a
formação social africana que até hoje continua mascarada para muitos
outros povos.
Texto de:
Awò Fagbenusola - Sacerdote da Indigenous Faith of African Tradition, Isin Egúngún ati Orò.
Responsável pela Ègbé Awò Omo Egúngún Onífe. Maricá / RJ - Brasil
As Máscaras nas Sociedades Africanas
Os domínios de intervenção
A máscara não é, na realidade,
esta figura esculpida que costumamos ver, ela é uma personagem, um ser
que representa por sua vez, uma divindade e uma força da sociedade
humana. No momento em que alguém a enverga, seu portador está investido
dos atributos reconhecidos de certa força divina ou social.
A máscara resulta numa
variedade de domínios de intervenção que atesta a variedade de suas
funções. Podemos distinguir quatro domínios de intervenção.Á máscara
intervêm nas cerimônias de iniciação, nos ritos ligados ao nascimento e
nas cerimônias funerárias; ela pode também dirigir os ritos de adoração.
Nesse domínio estritamente religioso, as máscaras servem de proteção
contra os espíritos maléficos e desempenham um papel de intermediários
entre os deuses e os homens.A máscara regula
os litígios da paz e da Guerra e suas decisões são então irrevogáveis;
no plano estritamente político as máscaras dão as diretrizes políticas
aos responsáveis pelos destinos da comunidade; enfim asseguram a
segurança das vilas e funcionam como policias das cidades. São ainda os
mascarados que trocam informações em caso de necessidade.
A
máscara desempenha um papel na vida económica porque deve velar pelo
bom desempenho das semeaduras e das colheitas, intervir para apaziguar
os deuses no caso das calamidades naturais que poderiam prejudicar a
vida agrícola e ameaçar a sobrevivência da comunidade.
As representações, as festas contam ainda com as máscaras
para as danças, o canto e os desfiles mascarados. Estes domínios de
intervenção correspondem ainda a funções sociais importantes
desempenhados pelos mascarados. Mas cada função pede um tipo de máscara
apropriada e a hierarquia das funções corresponde a uma hierarquia das
máscaras. A função fundamental é de manter a ordem.
A máscara é encarregada de manter a ordem do mundo, das
sociedades e das famílias. A máscara intervêm para regularizar a ordem
cósmica, ameaçada pelos interditos contra as leis sociais e naturais. Em
face das calamidades naturais e das catástrofes humanas, as máscaras
ordenam os sacrifícios para reparar os efeitos das transgressões que são
a causa de todos esses males.
Elas devem também velar pela rectitude dos modos sociais e
manter os interditos que fundam a estrutura das famílias e das cidades.
Enfim as máscaras de sabedoria ou grandes máscaras
decidem por derradeiro as causas que a justiça comum não consegue
regular. Sua intervenção nos problemas da guerra ou da paz visa também
preservar a ordem social. Mas uma questão nos vem ao espírito: porque a
necessidade de recorrer à máscara para assegurar a unidade social?
Para manter a ordem na sociedade e no mundo, os homens
tem tido a necessidade da autoridade dos deuses, dos espíritos e dos
ancestrais. As máscaras encarnam os depositários naturais e
sobrenaturais de autoridade. Elas funcionam como os fundamentos da lei,
fonte da ordem e da energia. Assim, a sacralização da autoridade através
de sua investidura (da máscara) torna-se um meio de assegurar a
legitimidade e a energia necessária. As máscaras aparecem então, em
última análise, como aparelhos ideológicos da sociedade tradicional
africana que asseguram a conservação da ordem natural e a procura do
equilíbrio e da luta contra a anarquia. Elas exprimem também a situação
das sociedades que procuram não romper a continuidade primordial entre o
mundo dos homens e o dos deuses, entre o natural e o sobrenatural.
Tradução livre do francês pelo Prof. Dr. Sérgio Paulo Adolfo – Tata Kiundundulu
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